1.08.2006

Esto post é dedicado ao meu amigo Jerico, fornecedor de palha ao Jumento (Link) a propósito do coice dado a Pinto Balsemão, e desejando-lhe que neste novo ano novo nunca lhe doam os cascos.

O patriota

Se o dr. Balsemão não tivesse criado há cinco anos em Carnaxide uma estação transformadora de telelixo, milhões ds portugueses, fartos dos bons programas da antiga RTP, veriam agora as rasquices da televisão espanhola. Estariam ainda mais dependentes do estrangeiro. Dariam ainda mais motivos a quem se atormenta ou se regozija com a crescente influência da Espanha sobre Portugal. O presidente da SIC fornece aos teleespectadores portugueses os produtos abjectos de que eles necessitam. Está para a televisão como o sr. Jacques Rodrigues esteve para a imprensa. Mas, num país onde quase tudo se comercializa com manuais em línguas bárbaras, ele é um patriota: transmite telelixo em português. Terá má gramática e pior léxico. Os consumidores, contudo, entendem. Não querem outra coisa. O Rei D. Carlos queixava-se da «piolheira»; o dr. Balsemão, entretendo-a, explora-a: ganha dinheiro com ela - e ainda temos de lhe agradecer. Agradeçamos também no entanto, ao dr. Soares e ao prof. Cavaco: ao dr. Soares, porque foi o primeiro a lançar a ideia da adesão à CEE; e ao dr. Cavaco, porque, cumprindo os critérios liberalizadores de Bruxelas, criou condições para o advento da SIC. Vemos, assim, que a integração não causou só perda de soberania. Permitiu, com o dr. Balsemão e o dr. Rangel, o nascimento de uma ampla célula de resistência patriótica. Mais: como a RTP passou a copiar a SIC, não temos uma, temos duas estações de tratamento de telelixo que teimam em cativar audiências na língua portuguesa. Para levarem o patriotismo às últimas consequências, falta apenas aos resistentes de Carnaxide e da 5 de Outubro consumarem a dobragem de todos os filmes estrangeiros - decerto sobre a direcção do sr. Guilherme Leite e do Sr. Tozè Martinho. Vivemos numa Europa sem fronteiras, onde as grandes fronteiras são a televisão e os cinemas. Nos grandes e pequenos ecrãs da Espanha, Júlia Roberts fala castelhano; nos da França, francês; e assim sucessivamente, menos em Portugal, um dos raros países não-anglófilos onde ela se exprime no «americano» de origem. A SIC é dos quatro canais o que transmite, proporcionalmente, menos enlatados com legendas. Dando aos portugueses os produtos interessantíssimos que a maioria deles quer, e fornecendo-os quase todos no idioma de toda a gente, o canal dos drs. Balsemão e Rangel emerge como o mais patriótico. Quando nos «tiram tudo», quando até nos «tiram» o que nunca tivemos, é alguma coisa deixarem-nos a língua. Nem que só para lamber sabão.


Este texto publicado em 18 de Outubro de 1997 na revista do Expresso, valeu a João Carreira Bom, o despedimento.

O boneco é de António/Expresso 1997

2 comentários:

Anónimo disse...

........A conquista económica de Portugal pela Espanha tem sido desejada pelos portugueses e apoiada pelos governos. Os espanhóis compram imobiliário porque há quem o venda. Vendem mercadoria de toda a espécie porque há quem lha compre e quem, nos supermercados, prefira os produtos espanhóis de superior qualidade. Adquirem acções nas empresas que lhes interessam, na banca, no comércio, na construção civil, na celulose e nas obras públicas, porque encontram vendedores e governos complacentes. Entraram ruidosamente na electricidade, no gás, na energia eólica, na imprensa, nos telefones e na televisão porque encontraram parceiros fáceis, assim como governos rendidos. O principal destino dos portugueses em férias é a Espanha. O maior grupo de visitantes estrangeiros em Portugal é o de espanhóis. O principal fornecedor das nossas importações é a Espanha. O primeiro cliente de Portugal é a Espanha. O principal investidor é a Espanha. Talvez seja a Espanha o principal destino actual da emigração temporária portuguesa. Há também milhares de trabalhadores que, todos os dias, se deslocam para trabalhar em Espanha. Assim como inúmeros portugueses que, vivendo perto da fronteira, escolheram as cidades espanholas para comprar as suas casas, mais baratas, para se fornecerem nos supermercados, mais variados, para festejarem nos restaurantes espanhóis, mais acessíveis. Sem falar nos nossos concidadãos que vão a Espanha ao médico, à farmácia e ao analista. Já há mais portugueses no Prado do que nas Janelas Verdes. E no museu de Arte Antiga, são mais os visitantes espanhóis do que portugueses. Todos estes são sinais de que o mercado, o consumidor, o bom povo, a classe média e o utente ratificam a conquista. O agrado é generalizado. As vantagens para o consumidor indiscutíveis. É provável, como já se viu com o Corte Inglés, que os costumes portugueses, graças à influência espanhola, mudem mais rapidamente. A longo prazo? Não sabemos. O que acontecerá com as liberdades e a independência? Não sabemos. Para já, sabemos que eles são melhores e mais ricos. Porque trabalham para isso e defendem os seus interesses. E nós não. Nem uma coisa nem outra.»

António Barreto "in publico"

MouTal disse...

Meu caro anónimo das 5.30
Você só transcreve a segunda parte do artigo do António Barreto, porquê?
Ou será você o encarregado de negócios do rei de Espanha?